Matamos o skeuomorphism (ou, para os que gostam de um tom mais abrasileirado, esqueumorfismo)? Se você também pensa que sim, leia algumas interessantes considerações sobre assistentes de voz e esqueumorfismo.
Parece que, há não muito tempo atrás, a humanidade resolveu abandonar interfaces esqueumórficas. Acostumamo-nos com a idéia de tocar em botões em telas e swipes para mover o conteúdo para a direita e para a esquerda; aprendemos que o conteúdo poderia estar fora de vista, mas ao alcance; graduamo-nos em uma representação mais plana e mais abstrata que ainda herda metáforas e relacionamentos espaciais, mas que provê a comunicação visual de forma mais sutil e implícita. Despojamos nossas interfaces visuais de seus ornamentos para permitir uma abordagem mais autêntica da estética visual.
Esqueumorfismo significa usar referências e metáforas do chamado mundo real em interfaces a fim de melhorar sua compreensão. Um botão esqueumórfico parece um interruptor físico; uma tela esqueumórfica pode ter uma textura de madeira.
Matar o esqueumorfismo nos fez sentir muito inteligentes sobre nós mesmos: finalmente não precisaríamos mais de botões brilhantes para entender que algo é possível!
O esqueumorfismo não está morto
Mas o skeuomorfismo está realmente morto? Não. Ele está vivo. E desta vez é invisível.
O novo esqueumorfismo está dentro dos assistentes de voz: Amazon Echo, Google Home, Siri, Alexa, Cortana…
O assistente humano como metáfora
O assistente de voz finge ser um humano sem corpo: ele fala como uma pessoa; nós o chamamos pelo nome; ele conta uma piada de vez em quando; define-se como masculino ou feminino; o som de um assistente de voz imita o som da entonação de fala humana.
A articulação da metáfora de um assistente humano e a forma como os assistentes de voz imitam os seres humanos é literal. Assim como os botões se parecem literalmente como botões em interfaces skeuomórficas, assistentes de voz que soam como seres humanos são esqueumorfismos.
A voz é a interface
Nos cernes da Alexa, Siri e Cortana estão algoritmos avançados de Inteligência Artificial que realizam pesquisas, executam comandos e lêem resultados. A voz é o canal de entrada e saída para esses algoritmos; é a interface que vai em frente com automação residencial, veículos autônomos e objetos inteligentes.
Tendo a voz como interface, o tópico psicologia da robótica começa a se tornar relevante. Semelhante às interfaces conversacionais, a voz pode desencadear uma resposta emocional, sugerindo interação com outro ser humano. O apego emocional, a vontade de fazer o “salto de fé” em uma metáfora, tudo isso faz parte do esqueumorfismo no assistente de voz.
Máquinas como metáforas para interfaces visuais
As interfaces visuais skeuomórficas utilizam referências e metáforas do mundo físico. As referências foram tipicamente feitas para superfícies táteis conhecidas. Tais superfícies eram painéis de controle conhecidos por máquinas pesadas ou comutadores domésticos comuns. As primeiras interfaces de computador foram bastante literais no uso dessas referências.
À medida que o computador se tornou “pessoal”, as metáforas do contexto do escritório foram introduzidas — a metáfora da “Área de Trabalho” foi a primeira instanciação da passagem do abstrato para o familiar. Com o advento dos dispositivos móveis mais pessoais com telas sensíveis ao toque, foi preciso mais detalhes no comportamento exato para tornar os objetos completos e acessíveis.
“Desesqueumorfizando” interfaces visuais
As pessoas finalmente nos familiarizamos com interfaces visuais em um grau que tornavam obsoletas as metáforas mais literais. A acessibilidade (Affordability) e a evitação (Avoidance) de componentes de interfaces visuais são compreensíveis sem skeuomorfismo. A definição da palavra “botão” passou de um domínio físico exclusivo para um virtual também.
Apesar de despojado do skeuomorfismo, as interfaces visuais de hoje ainda usam a superfície física como metáfora. Um botão ainda faz referência a um interruptor físico; ele simplesmente não é excessivamente literal.
“Desesqueumorfizando” interfaces de voz
O valor do assistente de voz não é determinado pelo seu nível de realismo em imitar o humano. Seu valor está em fornecer soluções para problemas humanos em seu papel como assistente pessoal, fonte de conhecimento, controlador, ponto de acesso a serviços etc.
Não há nada de errado ao inicializar o esqueumorfismo na concepção de interfaces de voz, mas há uma tendência de desobstrução dessas interfaces, tal como a testemunhamos para interfaces visuais. Isso acontecerá assim que as pessoas compreendam a voz como uma forma natural de interagir com produtos e serviços e desenvolverem a autenticidade comportamental correspondente. Provavelmente a “desesqueumorfização” da interface de voz será menos literal em imitar humanos e se concentrará mais no valor que consegue trazer para nós.
Biomimética e esqueumorfismo
O esqueumorfismo é uma camada superficial para abordar a interação humana com um produto ou serviço. O produto ou serviço, como tal, fornece uma solução para um problema humano. Compreender os princípios por trás das necessidades e desejos humanos, em última análise, resulta em excelentes produtos e serviços.
Um princípio de referência que pode ser aplicado na criação de produtos é a biomimética. A biomimética se manifesta em um nível muito mais profundo do que o esqueumorfismo e diz respeito a como e por quê um produto resolve problemas humanos, enquanto o esqueumorfismo é o literalismo inicial e temporário para a interação humana com eles.
Conclusão
O esqueumorfismo, em si, não é ruim, sendo necessário nos estágios iniciais de novos métodos de interação humana com a tecnologia. As interfaces visuais se deslocaram da era do skeuomorfismo quando as referências literais se tornaram obsoletas para compreender a interação. É possível esperar o mesmo acontecer com o esqueumorfismo invisível da interface de voz. Este será um desafio de design emocionante.
Como será (e soará) a desesqueumorfização da interface de voz?